Existe relação entre o estresse do cirurgião e complicações cirúrgicas?
- PriMed
- 12 de abr.
- 4 min de leitura
O seu desempenho já foi afetado por estresse excessivo?
O estresse do cirurgião refere-se às respostas psicológicas e fisiológicas enfrentadas durante ou antes de procedimentos cirúrgicos, em um ambiente de alta pressão como a sala de operação. Compreender essa relação é essencial para garantir a segurança do paciente e o bem-estar do profissional. Este texto analisa como o estresse pode influenciar complicações cirúrgicas, com base em evidências científicas atualizadas até março de 2025.
Medindo o Estresse do Cirurgião
O estresse pode ser avaliado por:
Marcadores biológicos: Incluem variabilidade da frequência cardíaca (VFC), como root mean square of successive differences (RMSSD) e standard deviation of RR intervals (SDNN), além de níveis de cortisol e condutância da pele. Por exemplo, Budden et al. (2023) relataram que a frequência cardíaca média aumentou em nove estudos, variando de 6 a 22 batimentos por minuto, indicando estresse agudo.
Relatos subjetivos: Questionários anônimos, como os usados por Anton et al. (2015), capturam a percepção do estresse, com 40% dos cirurgiões relatando complicações relacionadas ao estresse .
Essas medidas fornecem uma visão holística do impacto do estresse no desempenho cirúrgico.
Impacto do Estresse no Desempenho Cirúrgico
A literatura mostra que o estresse pode afetar tanto habilidades técnicas quanto não técnicas:
Estudos mostrando prejuízo em habilidades técnicas e não técnicas: Uma revisão sistemática de Arora et al. (2010) encontrou que o estresse agudo prejudica o manuseio de instrumentos e aumenta o tempo de conclusão de tarefas em ambientes simulados e reais [2]. Budden et al. (2023) confirmaram que a VFC, medida pela razão baixa frequência/alta frequência, aumentou significativamente em três de seis estudos, indicando maior estresse e impacto no desempenho.
Estudos ligando estresse a mais erros: Grantcharov et al. (2018) conduziram um estudo em Stanford Hospital entre maio e junho de 2017, envolvendo um cirurgião atendente em 25 procedimentos. Eles usaram uma camisa inteligente Hexoskin para medir VFC e encontraram taxas de eventos (desvios que causam lesão ou risco de dano) 47-66% mais altas em quantis de maior estresse, com os intervalos de 1 minuto mostrando a associação mais forte (P < 0,001). Isso sugere que o estresse agudo está diretamente ligado a mais erros técnicos.
Estudo recente sugerindo benefício do estresse inicial: Awtry et al. (2025), em um estudo de coorte multicêntrico envolvendo 38 cirurgiões e 793 pacientes, encontrou que o aumento do equilíbrio simpático-vagal (medido pela razão baixa frequência/alta frequência) nos primeiros cinco minutos de cirurgia estava associado a uma redução significativa nas complicações maiores, com uma razão de chances ajustada de 0,63 (IC 95%: 0,41-0,98; P = 0,04). Essa descoberta inesperada sugere que um certo nível de estresse inicial pode melhorar o foco e o desempenho, possivelmente devido à lei de Yerkes-Dodson, que postula um desempenho ótimo em níveis moderados de excitação.
Associação Entre Estresse e Complicações Cirúrgicas
A relação entre estresse e complicações não é linear, e a literatura apresenta evidências conflitantes:

Evidência indireta através do prejuízo no desempenho: Birkmeyer et al. (2013) habilidades técnicas e resultados do paciente, mostraram uma relação positiva entre sugerindo que, como o estresse prejudica essas habilidades, é provável que aumente o risco de complicações. Isso é suportado por estudos que ligam erros técnicos a eventos adversos, como infecções ou hemorragias.
Evidência direta de estudos medindo estresse e complicações: Grantcharov et al. (2018) forneceram evidências diretas de que níveis mais altos de estresse estão associados a mais eventos que podem levar a complicações, com taxas de eventos 55,5-66,1% mais altas em intervalos de maior estresse. Por outro lado, Awtry et al. (2025) contradizem isso, mostrando que o estresse inicial reduz complicações, destacando a complexidade da relação. Anton et al. (2015) também relataram que 40% dos cirurgiões testemunharam complicações intraoperatórias diretamente relacionadas ao estresse, com base em relatos subjetivos, mas isso não é evidência objetiva de causalidade.
Essa controvérsia sugere que o momento e o nível de estresse podem ser fatores críticos. Por exemplo, o estresse inicial pode preparar o cirurgião, enquanto o estresse prolongado pode levar a fadiga e erros.
Gerenciando o Estresse do Cirurgião
Para mitigar os efeitos do estresse, várias estratégias podem ser implementadas:
Técnicas de gerenciamento de estresse: Epstein e Krasner (2013) destacaram que a prática de mindfulness, técnicas cognitivas-comportamentais e exercícios físicos regulares ajudam a reduzir o estresse e melhorar o desempenho. Gold et al. (2009) mostraram que programas de prevenção de recaída baseados em mindfulness são eficazes para profissionais de saúde.
Suporte institucional e programas de treinamento: Shanafelt et al. (2017) argumentaram que hospitais devem oferecer sistemas de suporte, como mentorias e workshops, para ajudar cirurgiões a lidar com o estresse. Awtry et al. (2025) sugerem que o treinamento em gerenciamento de estresse pode otimizar o desempenho e reduzir complicações, com 82% dos cirurgiões favoráveis a esse tipo de treinamento.
Conclusão: Resumo e Direções Futuras
A associação entre o estresse do cirurgião e complicações cirúrgicas maiores é multifacetada. Estudos como Grantcharov et al. (2018) sugerem que o estresse elevado aumenta erros técnicos, potencialmente levando a mais complicações [3], enquanto Awtry et al. (2025) indicam que o estresse inicial pode reduzir complicações, uma descoberta inesperada que desafia suposições anteriores [4]. Essa complexidade destaca a necessidade de mais pesquisas para esclarecer como o nível, o momento e a duração do estresse afetam os resultados cirúrgicos.
Instituições e cirurgiões devem priorizar estratégias de gerenciamento de estresse para garantir a segurança do paciente e o bem-estar profissional, reconhecendo que a relação entre estresse e desempenho é dinâmica e depende de múltiplos fatores.
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