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Necrose pancreática: o que fazer com ela?

Atualizado: 26 de nov. de 2023

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Cerca de 20% dos casos de pancreatite aguda podem evoluir com necrose pancreática, uma condição de alta morbimortalidade. O tratamento da necrose pancreática é uma situação extremamente desafiadora para todos os médicos, em especial aos cirurgiões, e exige uma abordagem multiprofissional e criteriosa. É extremamente importante que toda a equipe envolvida tenha conhecimento dessa condição e esteja alinhada com a busca do melhor desfecho para o paciente.


Antes de mergulhar no tratamento da necrose pancreática, precisamos definir alguns conceitos.


O que causa a necrose no pâncreas?


A pancreatite aguda é mais comumente leve, o que significa um processo inflamatório principalmente local, sem repercussão clínica sistêmica. Em 10 a 20% dos casos, a inflamação promove liberação de citocinas, enzimas e outras substâncias que resultam em autodigestão, lesão tecidual, trombose, e necrose, tanto do pâncreas quanto dos tecidos peripancreáticos. O que ainda não está muito bem definido é a seguinte pergunta: por que alguns pacientes desenvolvem necrose no pâncreas e outros apenas uma inflamação mais branda?


Existem vários trabalhos na literatura a respeito de Pancreatite Aguda que discutem praticamente todos os aspectos dessa doença. Para facilitar para vocês, selecionamos 4 deles. Você pode vê-los no vídeo abaixo:



O que acontece quando parte do pâncreas fica necrosado?


A presença da necrose é, simultaneamente, um marcador de gravidade da inflamação, e um risco adicional na evolução do paciente ao longo da internação.

  1. Marcador de gravidade: os trabalhos mostram que pacientes com necrose pancreática apresentam desfechos piores em relação a complicações intra-hospitalares e óbito quando comparados aos casos sem necrose.

  2. A necrose pancreática pode ser um local de proliferação bacteriana e infecção, especialmente nos pacientes que apresentam uma resposta inflamatória sistêmica excessiva. A infecção da necrose pancreática é uma das complicações mais temidas da pancreatite aguda grave, e uma das mais letais.

Ainda, a necrose é um tecido "morto". Assim, o parênquima pancreático acometido por necrose, antes com suas funções endócrinas e exócrinas plenas, passa a não executar mais suas funções fisiológicas. Ou seja, a depender da extensão da necrose pancreática, o paciente pode apresentar diversos problemas, entre eles:

  • Esteatorréia (presença de gordura nas fezes): com sua função exócrina debilitada, as enzimas pancreáticas responsáveis pela digestão de gorduras, como a lipase, não estarão presentes em níveis adequados. A esteatorréia manifesta-se com fezes diarréicas mal cheirosas, com aspecto oleosa, associado a cólicas.

  • Desnutrição: as enzimas pancreáticas tem papel importante na digestão dos alimentos. O comprometimento da função exócrina pancreática resulta em má absorção de nutrientes e, consequentemente, desnutrição

  • Diabetes Mellitus: parte da função endócrina do pâncreas é o controle glicêmico através da secreção de insulina. Pacientes com necrose extensa do pâncreas podem evoluir com diabetes por insuficiência pancreática endócrina, necessitando de tratamento com insulina.


Como diagnosticar necrose pancreática?


A necrose pancreática é definida a partir de uma exame de imagem.


Mas não é qualquer exame de imagem... por exemplo, as radiografias simples não permitem a identificação dessa condição. rA ultrassonografia convencional tem baixa probabilidade de identificar a necrose de pâncreas também devido a sua localização e à possibilidade de interposição de gás.


Os dois exames mais usados nesse contexto são a tomografia computadorizada e a ressonância magnética de abdome. A tomografia de abdome é mais utilizada por ser um pouco mais disponível. Vale ressaltar a necessidade do contraste endovenoso para aumentar a capacidade de distinguir os tecidos necróticos do parênquima normal. De acordo com os estudos, a ressonância tem uma capacidade um pouco superior de identificar a necrose pancreática.


Figura demonstrando necrose pancreática na porção caudal do órgão, próximo ao baço

(Arquivo pessoal).


O que é Necrosectomia?


Necrosectomia refere-se a um procedimento cirúrgico que visa a retirada de tecido necrosado. Na prática, é um termo usado principalmente nos casos de tratamento da necrose pancreática.


Tradicionalmente a necrosectomia é um procedimento cirúrgico realizado por laparotomia (cirurgia aberta). Nos últimos anos, houve desenvolvimento de diversas técnica de necrosectomia, incluindo as seguintes vias:

  • Laparoscópica: acesso minimamente invasivo intraperitoneal. Nesses casos o cirurgião pode acessar o local da necrose e realizar o desbridamento utilizando os instrumentais laparoscópicos. Em alguns casos, como demonstrado neste vídeo, pode-se realizar uma anastomose de uma alça de intestino delgado com a parede da necrose encapsulada. A depender da localização, essa comunicação pode ser feita com o estômago.

  • Retroperitoneal: procedimento que tem ganhado espaço nos últimos anos por ser um acesso minimamente invasivo retroperitoneal. A vantagem desse procedimento, denominado VARD (Video-assisted Retroperitoneal Debridment), é que o acesso ao pâncreas é direto, sem precisar passar pelo peritônio, que costuma estar isolado do processo inflamatório nos casos de necrose pancreática.

  • Endoscópica: utilizando a ecoendoscopia (equipamento que acopla um transdutor de ultrassom ao endoscópio) é possível acessar a necrose pancreática através da parede gástrica (punção e drenagem transgástrica) e realizar o desbridamento local.

Quando e como tratar as complicações na necrose pancreática infectada?


Por muito tempo a necrose pancreática, mesmo sem infecção, foi considerada uma situação de tratamento cirúrgico. Os pacientes eram submetidos a necrosectomia aberta, porém os resultados não eram satisfatórios.



Com o passar do tempo essa conduta foi abandonada, e o tratamento cirúrgico passou a ser reservado para as situações de infecção da necrose pancreática. Mesmo assim, por ser uma doença extremamente grave, os resultados não eram dos melhores.


Em 2010, um estudo publicado no NEJM mudou a nossa abordagem a esses pacientes. Foi um estudo prospectivo, multicêntrico e randomizado que comparou pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico convencional àqueles submetidos a uma estratégia minimamente invasiva por etapas, denominada Step-Up Approach.


Os autores observaram um desfecho melhor, em termos de complicações e óbitos, nos pacientes submetidos ao Step-Up Approach. Assim, essa tem sido a estratégia utilizada atualmente nesses pacientes.


Confira no vídeo abaixo os resultados desse estudo e nossos comentários sobre essa estratégia e sobre a aplicação dos resultados do estudo!



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